O presidente da Fifa, Joseph Blatter, se prepara para realizar uma manobra surpreendente e pedir a divulgação de documentos judiciais que podem revelar que importantes dirigentes da entidade receberam propinas.
Os documentos fazem parte de uma investigação criminal sobre a falência da empresa de marketing esportivo ISL (International Sport and Leisure), parceira da Fifa, e indicam que dirigentes da entidade receberam pagamentos para garantir à ISL a lucrativa comercialização de direitos de transmissão e anúncios publicitários da Copa do Mundo durante os anos 1990.
Em novembro, uma investigação do programa Panorama, da BBC, apontou que estes dirigentes eram o ex-presidente da Fifa João Havelange e seu ex-genro Ricardo Teixeira, membro do comitê executivo da Fifa e presidente do comitê organizador da Copa do Mundo de 2014 no Brasil.
Por repetidas vezes, a Fifa bloqueou as tentativas de jornalistas que buscavam a divulgação dos documentos. Mas, agora, a BBC apurou que Blatter pretende defender a publicação dessas informações durante o encontro de dois dias do comitê executivo da Fifa, que será realizado na próxima quinta-feira em Zurique, na Suíça.
No ano passado, advogados que atuavam em nome da Fifa e dos dirigentes citados pagaram 5,5 milhões de francos suíços (cerca de R$ 10,7 milhões) para encerrar o caso e manter suas identidades em segredo.
De acordo com o Panorama, Teixeira recebeu cerca de US$ 9,5 milhões por meio de uma empresa de fachada chamada Sanud, criada no paraíso fiscal de Liechtenstein.
Na segunda-feira, a Superintendência da Polícia Federal do Rio confirmou a abertura de um novo inquérito sobre as transações envolvendo Teixeira.
A expectativa é de que as autoridades brasileiras peçam acesso aos documentos da Justiça suíça como parte da investigação.
Proposta de reforma
Em maio deste ano, a Fifa entrou pela segunda vez com um recurso contra uma decisão de promotores suíços pela divulgação dos documentos. O caso deve ir a julgamento no final deste mês em um tribunal na cidade de Zug, na Suíça.
Mas, diante da forte pressão por reformas que a Fifa enfrenta após sofrer duras acusações de corrupção contra seus dirigentes, Blatter decidiu que os documentos devem ser divulgados pela Justiça suíça e, se a sua decisão for aprovada pelo comitê executivo, vai pedir às autoridades suíças que isso aconteça.
Fontes ouvidas pela BBC dizem que a proposta faz parte de um pacote de mudanças que será apresentado pelo presidente da Fifa. Depois de prometer 'tolerância zero' com os casos de corrupção na entidade, Blatter foi convencido de que precisa demonstrar compromisso com a transparência na Fifa.
Entre as mudanças que Blatter deve propor estão as seguintes medidas:
Uma mudança no comitê executivo para incluir representantes de clubes e ligas; os membros seriam indicados pelas confederações continentais, como acontece hoje, mas teriam que ser aprovados pelas 208 associações que formam o congresso da Fifa; todos os integrantes do comitê executivo passarão a ter de revelar se tiveram algum envolvimento no passado com alguma investigação criminal, se já foram condenados e se têm algum conflito de interesses; o comitê de ética também sofrerá mudanças para se tornar totalmente independente da Fifa e composto por três novas partes (um promotor, uma unidade de investigações e um tribunal) um comitê de soluções formado por importantes personalidades de fora do esporte vai examinar assuntos delicados relacionados ao futebol a maneira como o país-sede da Copa do Mundo é escolhido também será modificada, com a escolha final cabendo ao congresso da Fifa, e não mais ao Comitê Executivo Estratégia de risco.
O pedido de divulgação dos documentos da Fifa deve ser a mais impactante das propostas. Mas trata-se de uma estratégia de alto risco.
Ricardo Teixeira é a principal figura à frente da Copa do Mundo de 2014 e deve ter um papel de destaque no anúncio, na próxima quinta-feira, do calendário e dos locais dos jogos do Mundial de 2014 e da Copa das Confederações de 2013.
Teixeira também é apontado como um possível candidato para suceder Blatter como presidente da Fifa em 2015.
A divulgação dos documentos também pode aumentar a pressão sobre outros membros do comitê executivo da Fifa. No ano passado, o Panorama apontou que um documento confidencial da ISL listava 175 pagamentos para indivíduos e empresas em um total de cerca de US$ 100 milhões.
Segundo o programa da BBC, a lista indicava que o paraguaio Nicolas Leoz, presidente da Confederação Sul-Americana de Futebol (Conmebol), recebeu mais de US$ 700 mil da ISL. A investigação também apontava que Issa Hayatou, presidente da Confederação Africana de Futebol (CAF), recebeu cerca de US$ 20 mil. Hayatou, Leoz e Teixeira negam as acusações.
Como parte da promessa de mais transparência na Fifa, Blatter e o secretário-geral da entidade, Jerome Valcke, têm trabalhado em conjunto com a ONG de combate à corrupção Transparência Internacional.
Um relatório sobre a Fifa produzido pela Transparência em agosto pedia que Blatter adotasse uma série de medidas para combater a corrupção na entidade.
Boa parte das reformas vai precisar do apoio da maioria dos 23 integrantes do comitê executivo e, por isso, há dúvidas sobre a sua aprovação. Se enfrentar uma oposição mais forte, Blatter pode ter de esperar até o próximo congresso da Fifa, em maio, em Budapeste, para tentar adotar as mudanças.
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