Por Antônio Jordão
Os maiores problemas da saúde são o subfinanciamento e os gestores que o aceitam. O subfinanciamento decorre da prioridade às avessas do governo federal: demasiado para o capital financeiro, pouquíssimo para as áreas sociais. Um dos países que menos investe em saúde, equiparado à média dos paupérrimos países africanos (de 196 o Brasil está na 151ª posição, segundo a OMS). Do orçamento federal, mais de50% é para a “dívida” (que não fui eu nem você que fizemos); apenas 10% destina-se a custear as despesas discricionárias (saúde, educação, bolsa-família, PAC, e outras!). Naturalmente, vai faltar na saúde!
Já os governadores, prefeitos e gestores da saúde pecam quando se conformam e se calam com o financiamento insuficiente; e pecam mais ainda quando aceitam ou também inventam soluções mágicas, tipo precarização, terceirização, serviço civil obrigatório. É a maneira de, seguindo a onda, também lavarem as mãos, tentarem transferir a responsabilidade que também é sua. Há até aqueles que sentem prazer em maltratar os trabalhadores.
Onde estão todos, que não mobilizam seus deputados e senadores, não promovem uma marcha à Brasília para ampliar os recursos da saúde?
Nesses 23 anos de existência, a maior dívida do SUS é com seus trabalhadores. O sistema que é único não criou uma carreira também única. Pelo contrário, os trabalhadores que já cofinanciam o sistema quando percebem baixos salários, tem sua remuneração ainda mais reduzida, quando lhe negam o concurso público constitucional, lhes sonegam direitos trabalhistas, e aumentam sua carga de trabalho com as terceirizações. Desta forma, resta comprometida a função de estado, e criam-se agruras ao desempenho dos profissionais, abandonando a tese de que se trabalha para viver, e não se vive para trabalhar; e não se assegura a assistência integral à saúde de todos. É o estado desumano.
A portaria 134 da SAS/Ministério da Saúde colocou em xeque o sistema: o MS cobrou o que já se sabia; tentou restringir ainda mais a atividade profissional dos médicos; e extrapolou ao tentar impingir exigências ilegais: limitar o número de vínculos privados e determinar quais vínculos públicos o médico teria que ficar caso fossem constatados o registro de mais de dois.
O desprendimento e solidariedade da categoria médica é grande. Os médicos sabem que o limite de vínculos públicos é dois; no entanto, chamados pelos gestores para garantir assistência, principalmente os que moram em cidades pólo do interior, não se furtaram a trabalhar; o preço que pagam é, além da exposição, o aumento da carga de trabalho e perda de qualidade de vida. Trata-se, então, de compromisso com a população vizinha não assistida. Porém, diante da quebra do pacto, e da ameaça, os médicos estão entregando os postos extras– mesmo contra a vontade.
Como evitar a desassistência? Com calma, com prazo, como é concedido ao governo quando se encontra sob pressão do Tribunal de Contas ou do Ministério Público. Como fez a Promotoria de Justiça na comarca de Salgueiro/PE e municípios vizinhos: através de Termo de Ajustamento de Conduta, foi acordado prazo de seis meses de permanência dos profissionais, enquanto as prefeituras realizam concurso público. A grande iniciativa deveria ser do Ministério da Saúde que, infelizmente, se limitou a dizer que iria dar o que já se tem: o direito do próprio profissional informar alteração no CNES; e irá promover mudanças na portaria a contragosto, decorrente de decisão judicial em ação impetrada pelo Simepe. Por outro lado, o governo estadual e municipais podem fazer muito: adequação de jornada de trabalho. Instrumento do qual se pode lançar mão de imediato. Vínculos de 20 horas podem ser ampliados para 40 horas, sem delongas, evitando a desassistência. Basta querer fazer.
Solução definitiva passa pela política para os trabalhadores do SUS –há 23 anos esperando. E necessariamente sob a responsabilidade do MS, estimulada a partir dos municípios e estados, COSEMS, CONASEMS, CONASS, Frentes Parlamentares, conselhos e conferências de saúde, sindicatos e centrais sindicais, movimentos sociais. Ultrapassando-se a teimosia do governo federal em adiar o inevitável: aumentar sua parcela nos investimentos da saúde. É possível? Claro! A União já financiou 75% da saúde pública, hoje financia pouco mais de 40%!
PS: Antônio Jordão é médico e secretário-geral do Simepe
Blog de Jamildo
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