Por Cláudio Santos
Durante as investigações da Operação Monte Carlo, Wilton Tapajós de Macêdo, de 54 anos, foi abordado por um grupo de policiais militares goianos, em Luziânia (GO). O agente federal assassinado há uma semana tentava descobrir detalhes de como agia uma ex-funcionária da prefeitura acusada de recrutar servidores públicos para integrar a quadrilha do bicheiro Carlinhos Cachoeira. A revelação foi feita ontem, na 11ª Vara Federal, em Goiânia, pelo policial federal Fábio Alvarez, a primeira testemunha ouvida durante a audiência de instrução que julga os supostos crimes cometidos pelo contraventor e seu grupo.
Polícia reforça suspeita de que morte de agente da PF foi premeditada
De acordo com Alvarez, que, como Tapajós, trabalhou na Operação Monte Carlo, o colega fazia campana nas proximidades da casa da ex-servidora Sônia Regina Melo quando policiais o abordaram. O agente teria usado estratégias para despistar os soldados e não revelar a identidade policial, o que poderia prejudicar a apuração. “Ele estava parado em um veículo e foi abordado. Tapajós, para preservar a investigação e não colocar em risco sua integridade, disse que estava esperando o chefe dele ligar. Por coincidência, houve uma ligação da nossa base, que deu um ar de veracidade à história”, relatou.
A testemunha, porém, não soube dizer se o episódio teve ligação com o assassinato do colega. Alvarez não se recorda da data da abordagem, mas afirmou que o colega de corporação atuou na linha de frente das investigações que resultaram na criação da CPI do Cachoeira no Congresso. Durante as diligências, Tapajós teria desvendado, por exemplo, o funcionamento da cadeia de corrupção montada por Cachoeira, que incluía o pagamento de propina a delegados, coronéis e outras autoridades da área de segurança pública de Goiás. O dinheiro sujo comprava o silêncio dos agentes, que faziam vista grossa para os esquemas mantidos pelo contraventor, principalmente as casas clandestinas de jogos de azar espalhadas por quase todos os 19 municípios do Entorno do Distrito Federal.
Alvarez também informou que, durante as investigações da Monte Carlo, outra equipe da Polícia Federal foi abordada por policiais supostamente cooptados pela organização criminosa de Cachoeira. Os federais à paisana tiveram o carro monitorado. Além disso, a placa do veículo descaracterizado chegou a ser consultada pela Secretaria de Segurança do estado. Segundo o agente da PF, o próprio Tapajós relatou o episódio, mas os policiais militares envolvidos na abordagem não foram, à época, identificados entre os PMs suspeitos que constam na denúncia do Ministério Público.
A advogada do bicheiro, Dora Cavalcanti, pediu que Alvarez detalhasse as circunstâncias da abordagem de Tapajós em frente à casa de Regina. A defensora tentou desqualificar a informação com base na ausência de provas que envolvam os militares citados. “Os policiais em questão não foram identificados no âmbito da Monte Carlo e poderiam ser apenas agentes públicos zelando pela ordem”, argumentou. O procurador da República Daniel Resende Salgado, no entanto, não descartou a possibilidade de que os policiais militares fizessem parte da rede de segurança das casas de bingo de Cachoeira.
Depoimento contundente
Até agora, o depoimento do agente Fábio Alvarez é o mais contundente sobre a morte de Wilton Tapajós. Desde a execução do policial, as polícias Civil e Federal tratam o assunto com cautela. Nas poucas vezes em que falaram sobre o caso, delegados das duas corporações avaliaram como pouco provável que o crime esteja relacionado ao trabalho desempenhado por Tapajós dentro da corporação. Durante o enterro do policial, na quinta-feira, a superintendente da PF no Distrito Federal, Silvana Helena Vieira Borges, disse não acreditar em queima de arquivo. “Por enquanto, não relacionamos o assassinato com as operações de que Wilton participou”, declarou.
Ontem, após a oitiva do policial Fábio Alvarez, ninguém da PF quis se pronunciar. O diretor-geral da Polícia Civil do DF, Jorge Xavier, preferiu não comentar as declarações de Alvarez e apenas reforçou que as investigações serão mantidas em sigilo. “Para não atrapalhar o trabalho dos policiais, não vamos falar sobre isso até termos algo concreto”, resumiu Xavier.
O comandante da Polícia Militar de Goiás, coronel Edson Costa, não foi localizado para comentar as denúncias de que seus subordinados teriam abordado o agente federal durante as investigações que resultaram na Operação Monte Carlo.
Memória
Crime misterioso
O policial federal Wilton Tapajós Macêdo, de 54 anos, foi assassinado com dois tiros na cabeça, na terça-feira da semana passada, diante do túmulo dos pais, no Cemitério Campo da Esperança, em Brasília. Perícia revelou que o agente estava agachado no momento em que foi atingido pelos disparos, efetuados de cima para baixo. Tapajós chegou ao cemitério em um Gol branco, registrado no nome do filho Renato Alves Tapajós. Levava flores ao túmulo dos familiares, como fazia com frequência. Não se sabe quantas pessoas participaram do assassinato. Pelo menos um dos bandidos fugiu com o carro de Tapajós, que não tinha sido encontrado até a noite de ontem.
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