" Sigo em frente, pra frente eu vou
sigo enfrentando as ondas onde muita gente naufragou ..."



sábado, 7 de julho de 2012

Mesmo acostumados com cenas de CSI, peritos dizem ser difícil encarar um crime como o caso Yoki

polícia científica 
Daia Oliver/R7

Por Cláudio Santos
Nos seriados policiais, os roteiristas de TV fazem parecer fácil concluir quem foi o autor e entender como um crime aconteceu a partir de pequenos vestígios. Já na vida real o trabalho é bem diferente. Não há roteiro definido para as investigações e a rotina estressante pode prejudicar até a vida pessoal do perito criminal. Há quase 20 anos nessa área, o físico Ermindo Lopes Filho do IC-SP (Instituto de Criminalística do Estado de São Paulo) conta que, na busca pelos vestígios de um crime, é preciso ter olhos treinados, enfrentar cenas fortes, e até fazer terapia. Um caso como o do empresário Marcos Kitano Matsunaga, morto e esquartejado pela própria mulher, por exemplo, é chocante até para quem tem anos de experiência.

Filho conta que o trabalho de um perito começa logo após o crime, quando a Polícia Militar - após fazer a primeira "vistoria" - preserva o local e o IC é chamado. É feita, então, uma varredura em busca de provas materiais. Segundo Filho, perito e fotógrafo caminham “quase que paralelamente” para gravar todos os vestígios deixados.

— Às vezes tem uma pegada, uma mancha de sangue, tudo é fotografado e medido. Se o cadáver está no local, fazemos o entorno até o limite da pele dele. O estudo para dentro do corpo, quem faz é o IML [Instituto Médico Legal]. Com a junção dos dois laudos, é possível ter ideia do que aconteceu. Olhamos sinais de arrombamento, posição em que cada elemento se encontra, se a roupa da pessoa foi rasgada. 
"Ver corpos não choca mais", diz diretor do IML

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Segundo o físico, ao ver o tipo de lesão provocada na pele, o perito consegue “chegar à arma usada no crime”, por exemplo. Ele conta que “a experiência” também ajuda a sentir a dinâmica do acontecimento.

— É preciso sentir se o crime foi passional, latrocínio, desova. Dependendo da cena, começo a buscar possibilidades e pensar no autor. Num ambiente rural, a vítima sofreu lesão com uma marreta... Certamente essa marreta ficou por lá, porque só pode ter sido uma briga [...] Geralmente, crimes que não são premeditados os autores usam armas improvisadas, como faca, tesoura, saco plástico. Já arma de fogo, em geral, é para crimes premeditados e a pessoa leva embora [sic].

Depois do levantamento de vestígios, é necessário traçar o “vínculo” entre o fato e os “atores daquele ambiente”, explica Adílson Pereira, diretor do IC-SP.

— Com esses materiais biológicos [sangue, saliva, cabelo] devidamente tratados é possível estabelecer de quem eles vieram. O laboratório elabora a análise, volta para o perito, ele junta tudo e forma um laudo. Essa peça técnica científica vai entrar no processo e é quase irrefutável.

Dificuldades

Uma das principais dificuldades do trabalho, segundo Pereira, são os fatores que modificam os vestígios. Ele conta que a “contaminação do ambiente” ou das pessoas que “conhecem criminalística e mudam o local” atrasam o trabalho. 

— Autor que tem tempo de pensar e tempo para disfarçar, fica mais difícil para nós. O Mizael Bispo [acusado de matar Mércia Nakashima] é ex-policial e advogado e tem conhecimento de criminalística. A família dos Nardoni também. Precisamos usar cada vez mais tecnologias para chegar ao responsável. Os policiais também, se não estão bem treinados, podem contaminar o ambiente. Por exemplo, nós perdemos de 80 a 100 fios de pelo por dia.  

Problemas de saúde
Lidar com cenas monstruosas muitas vezes ainda provocam “perturbação” psicológica no profissional, conta Filho. Ele mesmo diz que já se sentiu mal ao ver casos de corpos em putrefação.

— Trabalhava com isso numa fase em que estava morando sozinho. Eu acordava e pensava “se eu morrer aqui, vão me achar da mesma forma”, porque quando passam dias depois da morte, o corpo fica enorme. Aliás, é muito difícil ver uma pessoa esquartejada. Um corpo sem cabeça, uma cabeça sem corpo. Ter que juntar os pedaços para fotografar. Nessa época, procurei um psiquiatra e tomei remédio.

Representante do Sindicato dos Peritos Criminais do Estado de São Paulo, Maria Márcia Kesselring, diz que a falta de profissionais na área é também um dos fatores que tem prejudicado a vida do perito no Estado. Segundo ela, isso faz com que as poucas pessoas que trabalham na área tenham um rotina de trabalho “extremamente estafante”. 

— Os profissionais são muito estressados. Eles chegam a atender de 30 a 40 locais por dia, lidando com todo tipo de crime. Têm pessoas que chegam a trabalhar 88 horas, mais que o dobro das 44 horas permitidas na semana.


R7

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